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Oração a Santo Ivo


Oração a Santo Ivo Glorioso Santo Ivo, lírio da pureza, apóstolo da caridade e defensor intrépido da justiça, vós que, vendo nas leis humanas um reflexo da lei eterna, soubestes conjugar maravilhosamente os postulados da justiça e o imperativo do amor cristão, assisti, iluminai, fortalecei a classe jurídica, os nossos juízes e advogados, os cultores e intérpretes do Direito, para que nos seus ensinamentos e decisões, jamais se afastem da eqüidade e da retidão. Amem eles a justiça, para que consolidem a paz; exerçam a caridade, para que reine a concórdia; defendam e amparem os fracos e desprotegidos, para que, pospostos todo interesse subalterno e toda afeição de pessoas, façam triunfar a sabedoria da lei sobre as forças da injustiça e do mal. Olhai também para nós, glorioso Santo Ivo, que desejamos copiar os vossos exemplos e imitar as vossas virtudes. Exercei junto ao trono de Deus vossa missão de advogado e protetor nosso, a fim de que nossas preces sejam favoravelmente despachadas e sintamos os efeitos do vosso poderoso patrocínio. Amém.


Amazônia desmatamento zero

O direito de não produzir provas contra si mesmo e prova da embriaguez ao volante

A tipificação do crime de embriaguez ao volante está condicionada à vontade do acusado em colaborar assoprando o etilômetro ou cedendo sangue para exame.

RESUMO
Análise da possibilidade do condutor de veículo automotor se recusar a se submeter aos exames e testes para verificação de consumo de álcool sem que isso implique em sanções administrativas ou penais em face do princípio jurídico de que ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo.

PALAVRAS-CHAVES: Exames e testes de alcoolemia. Lei Seca. Princípio nemo tenetur se detegere.

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INTRODUÇÃO
Dados do Conselho Nacional de Trânsito indicam que anualmente mais de 33 mil pessoas são mortas e cerca de 400 mil tornam-se feridas ou inválidas em acidentes de trânsito e esses números representam uma das principais causas de morte prematura da população economicamente ativa do Brasil, gerando um alto custo social.

O álcool, uma droga lícita e com consumo tolerado pela sociedade, é reconhecidamente um fator que contribui para esse elevado número de acidentes por prejudicar as funções e sentidos necessários aos condutores de veículos automotores, diminuindo a segurança do trânsito.

Nesse contexto, foi editada a Lei nº 11.705, de 19 de junho de 2008, que alterou a redação dos arts. 165, 276, 277 e 306 do Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503/97), visando reprimir mais severamente o consumo de álcool pelos condutores de veículos automotores.

Essa alteração legislativa foi amplamente divulgada pelos meios de comunicação que a "apelidaram" de Lei Seca e trouxe ao debate a obrigatoriedade da submissão do condutor aos testes de alcoolemia para verificação de sua embriaguez.

O presente estudo monográfico defende a não obrigatoriedade do condutor em se submeter aos exames e testes de alcoolemia em face do princípio jurídico nemo tenetur se detegere, que se manifesta no direito do acusado de não ser obrigado a produzir provas contra si mesmo, nem a colaborar com a investigação ou instrução penal.

O estudo é composto por três capítulos. No primeiro é analisada a natureza jurídica, a aplicabilidade e a abrangência do princípio nemo tenetur se detegere e sua incorporação ao ordenamento jurídico brasileiro, harmonizando-o com outros princípios do processo penal.

O segundo capítulo trata sobre os efeitos do álcool no organismo humano e sobre as conseqüências administrativas e penais aplicáveis ao condutor que dirige alcoolizado.

Finalmente, o terceiro capítulo analisa a obrigatoriedade da submissão do condutor de veículo automotor aos exames e testes de alcoolemia em face do princípio nemo tenetur se detegere e as conseqüências jurídicas de sua recusa.

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CAPÍTULO I - PRINCÍPIOS, DIREITO E GARANTIAS FUNDAMENTAIS

1.1 A natureza jurídica, aplicabilidade e abrangência do princípio nemo tenetur se detegere

Os direitos fundamentais resultam de um movimento de constitucionalização histórico enfatizado a partir do século XVIII e encontram-se incorporados ao patrimônio comum da humanidade. São direitos inerentes à pessoa humana, decorrentes de sua própria natureza e, portanto, imprescritíveis, irrenunciáveis, invioláveis, universais e de aplicação imediata.

Entre os direitos fundamentais estão os direitos às liberdades clássicas (liberdade de locomoção, propriedade, vida e segurança), conhecidos como direitos de 1ª geração. São os direitos civis e políticos do homem e constituem limitações às ações estatais.

O princípio nemo tenetur se detegere é considerado como direito fundamental do homem, estando entre os classificados como direitos de 1ª geração, visto objetivar proteger o indivíduo contra os excessos cometidos pelo Estado durante a persecução penal, protegendo-o contra violências físicas e morais empregadas para forçá-lo a colaborar com a apuração da materialidade e autoria dos ilícitos penais. [01]

Entretanto, o direito de não produzir provas contra si mesmo não fica restrito a fase judicial da persecução penal, podendo ser exercido também durante a investigação criminal ou até mesmo em instâncias não penais, sempre que, na relação Estado-indivíduo, marcada pela superioridade hierárquica estatal, houver a possibilidade de o indivíduo produzir provas em seu desfavor.

Luiz Flávio Gomes, ao estabelecer o conteúdo do referido princípio, ensina que ele possui várias dimensões: (a) direito ao silêncio, (b) direito de não colaborar com a investigação ou a instrução criminal; (c) direito de não declarar contra si mesmo, (d) direito de não confessar, (e) direito de declarar o inverídico, sem prejudicar terceiros, (f) direito de não apresentar provas que prejudique sua situação jurídica, (g) direito de não praticar nenhum comportamento ativo que lhe comprometa, (h) direito de não ceder seu corpo (total ou parcialmente) para a produção de prova incriminatória. [02]

Uma característica interessante dos direitos fundamentais é a sua relatividade, visto eles não serem absolutos. Há no caso concreto, muitas vezes, conflito de interesses, devendo o aplicador do direito decidir qual direito prevalecerá, levando em consideração a máxima efetividade dos direitos envolvidos com a sua mínima restrição. Tal fato ocorre com o princípio nemo tenetur se detegere que não pode ser invocado, por exemplo, para prejudicar terceiros ou para justificar crimes subseqüentes.

Nesse sentido:

Incabível o pleito absolutório pelo delito de falsa identidade, pois aquele que apresenta Carteira de Identidade falsa, objetivando ocultar o seu passado, inclusive, mandado de prisão em aberto, não pode alegar que agiu em autodefesa, ou no direito da não auto-incriminação, já que o Direito Constitucional de permanecer calado e de não colaborar que lhe é deferido não inclui o de falsear a própria identidade. [03]
1.2 O princípio nemo tenetur se detegere no ordenamento jurídico brasileiro

Não existe na Constituição Federal de 1988 nenhum dispositivo expresso prevendo que ninguém será obrigado a produzir provas contra si mesmo. O art. 5º, LXIII apenas estabelece que o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado.

Dessa forma, segundo uma visão restritiva, entende-se que o direito de não se declarar culpado alcançaria apenas a pessoa do preso, que, mesmo assim, deveria se submeter passivamente a persecução penal.

O princípio da não auto-incriminação somente foi expressamente promulgado no Brasil pelo Decreto nº 592, de 6 de julho de 1992, que promulgou o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, estabelecendo em seu art. 14, 3, g que toda pessoa acusada de um delito terá direito de não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a confessar-se culpada.

O Decreto nº 678, de 6 de novembro de 1992, que promulgou a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica) também passou a prever expressamente o princípio nemo tenetur se detegere, estabelecendo em seu art. 8º que toda pessoa acusada de um delito tem o direito de não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a confessar-se culpada.

Antes da promulgação da Emenda Constitucional nº 45, de 30 de dezembro de 2004, que inseriu o art. 5º, § 3º ao texto constitucional, havia discussão sobre qual seria o caráter normativo dos tratados internacionais sobre direitos humanos adotados pelo Brasil.

Pedro Lenza, analisando essa discussão no âmbito do Supremo Tribunal Federal afirma que havia 4 principais posições: a) natureza supraconstitucional; b) caráter constitucional; c) status supralegal e d) caráter de lei ordinária. Sustenta que o tribunal adotava a teoria de paridade normativa entre os tratados internacionais e as leis ordinárias. [04]

Entretanto, no ano de 2008, o Supremo Tribunal Federal, em análise de diversos processos sobre a possibilidade de prisão civil do depositário infiel, hipótese de prisão civil não admitida pelo Pacto de São José da Costa Rica, consolidou o entendimento de supralegalidade dos tratados internacionais sobre direitos humanos. [05]

Segundo esse entendimento, apesar desses tratados não gozarem de status constitucional têm força normativa suficiente para tornar inaplicável toda a legislação infraconstitucional contrária, seja ela anterior ou posterior a incorporação do tratado.

Assim, apesar de o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica) não terem se submetido ao procedimento descrito no art. 5º, §3º da Constituição Federal, possuem status supralegal, não podendo a legislação ordinária contrariá-los, estabelecendo vedação à aplicação do princípio nemo tenetur se detegere.

1.3 Princípios do processo penal e a harmonia com o princípio nemo tenetur se detegere

Os princípios jurídicos além de sua normatividade, impondo condutas e vedando a adoção de comportamentos com eles incompatíveis, possuem também a função de auxiliar o aplicador do direito na interpretação das normas positivadas e no preenchimento das lacunas da lei.

O processo penal é regido por uma série de princípios e regras que norteiam a política processual penal do Estado e, no atual estágio de desenvolvimento da democracia brasileira, representam um instrumento a serviço da liberdade individual.

A Constituição Federal de 1988 estabeleceu em seu art. 5º, LIV o princípio do devido processo legal (due processo of law), dispondo que ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal, ou seja, sem que tenha havido a tramitação de um processo segundo o estabelecido em lei.

Segundo Tourinho Filho, o devido processo legal relaciona-se com uma série de direitos e garantias constitucionais, tais como presunção de inocência, duplo grau de jurisdição, direito de ser citado e de ser intimado de todas as decisões que comportem recurso, ampla defesa, contraditório, publicidade, juiz natural, imparcialidade do julgador, vedação às provas ilícitas, motivação das decisões, dignidade humana, integridade física, liberdade e igualdade entre as partes. [06]

Segundo Maria Elizabeth Queijo, dentre as garantias que compõem o devido processo legal encontra-se o princípio nemo tenetur se detegere, vedando a obrigatoriedade da cooperação do acusado na persecução penal. [07]

Já, o art. 5º, LV, da Constituição Federal enuncia que aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.

O princípio do contraditório é um dos requisitos de validade do processo e exige que seja dado conhecimento dos atos processuais ao acusado para que ele possa participar e contrariar os referidos atos.

Enquanto o contraditório exige a garantia de participação no processo, a ampla defesa representa um plus, visto impor a realização efetiva dessa participação, seja pela defesa técnica ou autodefesa.

Maria Elizabeth Queijo estabelece que a autodefesa engloba também o direito de recusa em colaborar na produção de provas que possam importar em auto-incriminação. [08]

O princípio da inocência ou da não culpabilidade expresso no art. 5º, LVII determina que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

Assim, em decorrência desse principio jurídico, há inversão do ônus probatório, devendo a acusação fazer prova da existência do fato criminoso e de sua autoria, cabendo à defesa apenas provar eventual presença de fato caracterizador de excludente de ilicitude ou de culpabilidade.

Quando houver dúvidas sobre a existência do fato ou de sua autoria ou quando a prova for dúbia, deve-se aplicar o princípio in dúbio pro reo, pois se presume ser o réu inocente.

Segundo Nucci, o princípio nemo tenetur se detegere decorre da conjugação dos princípios constitucionais da presunção de inocência e ampla defesa, afirmando que o indivíduo é inocente até que se prove sua culpa e que ele possui o direito de produzir amplamente provas em seu favor, bem como de permanecer em silêncio sem que isso lhe traga prejuízo, sendo perfeitamente claro que não está obrigado a produzir provas contra si mesmo. [09]

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CAPÍTULO II – DA EMBRIAGUEZ AO VOLANTE

2.1 O álcool e os efeitos provocados no organismo

O álcool corresponde a uma classe de compostos químicos orgânicos que possui em sua estrutura molecular um ou mais grupos hidroxilas (-OH) ligados a um carbono saturado.

O tipo mais comum em bebidas alcoólicas é o álcool etílico de composição CH3CH2OH, que é originado pela fermentação dos açúcares presentes em cereais, raízes e frutas.

Apesar de as bebidas alcoólicas possuírem grande aceitação social e seu consumo ser estimulado pela sociedade, o álcool é uma droga psicotrópica que atua no sistema nervoso central, podendo causar dependência e mudanças comportamentais.

O álcool age como depressor do sistema nervoso central, alterando percepções e comportamentos, podendo aumentar a agressividade e diminuir a atenção, causando danos através da toxidade, direta e indireta sobre diversos órgãos e sistemas corpóreos, podendo gerar intoxicação aguda e dependência.

Arthur Guerra de Andrade denomina alcoolemia como a concentração de álcool no sangue e afirma que ela varia em razão de questões metabólicas individuais, mas que, em geral, uma dose de álcool para um homem adulto de 70 kg gera uma alcoolemia de 0,2 g de álcool por litro de sangue. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estabelece como uma dose o equivalente a 14 g de álcool, quantidade presente em uma lata de cerveja de 350 ml, ou em uma taça de vinho de 140 ml ou em dose de 35 ml de bebidas destiladas. [10]

Os níveis máximos de alcoolemia ocorrem após meia hora de consumo, mas pode variar conforme a velocidade de ingestão, o consumo prévio de alimentos, a vulnerabilidade individual à substância, sexo, idade, peso, interação com medicamentos e outras drogas. [11]

Os principais efeitos relacionados à alcoolemia foram condensados no quadro elaborado pelo Departamento de Adolescência da Sociedade Brasileira de Pediatria:

QUADRO 1

Estágios da intoxicação alcoólica

Alcoolemia (dg/l)
Efeitos

1 a 3
•Início dos efeitos de relaxamento
•Leve euforia e relaxamento
•Diminuição da timidez
•Funções visuais e acompanhamento de movimento já alterados

4 a 6
•Movimentos já alterados
•Taquicardia e aumento do padrão respiratório
•Diminuição de funções cerebrais
•Dificuldades no processamento de informações e tarefas de atenção dividida
•Diminuição de inibições
•Relaxamento

6 a 10
•Aumento de sintomas ansiosos e depressivos
•Diminuição de atenção, reações mais lentas e problemas de coordenação e força muscular
•Baixa capacidade de tomar decisões

10 a 15
•Reações ainda mais lentas
•Dificuldades de equilíbrio, movimentos e funções visuais
•Fala arrastada

16 a 29
•Diminuição de respostas a estímulos externos
•Problemas motores (quedas e falta de coordenação motora)

30 a 39
•Desmaios
•Anestesia (comparável à usada para cirurgias)
•Estupor

40 e acima
•Dificuldades respiratórias
•Morte

Fonte: Departamento de Adolescência da Sociedade Brasileira de Pediatria (2007, p.14)

Em razão dos efeitos provocados no organismo humano devido à ingestão de bebidas alcoólicas, várias funções necessárias aos condutores de veículos automotores ficam prejudicadas: visão, coordenação motora, tempo de reação e capacidade de tomar decisões. Somam-se a esses efeitos as alterações comportamentais que podem fazer com que o condutor se sinta mais seguro para enfrentar situações perigosas como excesso de velocidade, ultrapassagens, avanço de sinal vermelho, entre outras.

Assim, afirma-se que a ingestão de álcool pelo condutor diminui a segurança do trânsito, expondo toda a coletividade a perigo de graves acidentes, com enormes perdas materiais e humanas.

Dados epidemiológicos dos Estados Unidos relacionados às conseqüências do consumo de álcool no trânsito indicam que o risco de um condutor com alcoolemia entre 2 e 5 dg/l morrer em um acidente de trânsito envolvendo apenas um veículo pode ser até 4,6 vezes maior que o de um condutor sóbrio. Para alcoolemias entre 5 e 8 dg/l, esse valor pode chegar até 17 vezes. Já, para alcoolemias a partir desse valor, o aumento do risco pode chegar até 15.560 vezes, indicando que o consumo abusivo de álcool implica em um grande risco de envolvimento em acidentes fatais. [12]

2.2 A infração administrativa descrita no art. 165 do Código de Trânsito Brasileiro
A Lei nº 11.705/08 trouxe profundas alterações nas disposições da Lei nº 9.503/97 – Código de Trânsito Brasileiro, referentes ao tratamento da infração administrativa de dirigir sob a influência de álcool. Os artigos 165, 276 e 277 receberam nova redação e passaram a dispor:

Art. 165. Dirigir sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência:

Infração - gravíssima;

Penalidade - multa (cinco vezes) e suspensão do direito de dirigir por 12 (doze) meses;

Medida Administrativa - retenção do veículo até a apresentação de condutor habilitado e recolhimento do documento de habilitação.

Parágrafo único. A embriaguez também poderá ser apurada na forma do art. 277.

Art. 276. Qualquer concentração de álcool por litro de sangue sujeita o condutor às penalidades previstas no art. 165 deste Código.

Parágrafo único. Órgão do Poder Executivo federal disciplinará as margens de tolerância para casos específicos.

Art. 277. Todo condutor de veículo automotor, envolvido em acidente de trânsito ou que for alvo de fiscalização de trânsito, sob suspeita de dirigir sob a influência de álcool será submetido a testes de alcoolemia, exames clínicos, perícia ou outro exame que, por meios técnicos ou científicos, em aparelhos homologados pelo CONTRAN, permitam certificar seu estado.

§ 1º Medida correspondente aplica-se no caso de suspeita de uso de substância entorpecente, tóxica ou de efeitos análogos.

§ 2º A infração prevista no art. 165 deste Código poderá ser caracterizada pelo agente de trânsito mediante a obtenção de outras provas em direito admitidas, acerca dos notórios sinais de embriaguez, excitação ou torpor apresentados pelo condutor.

§ 3º Serão aplicadas as penalidades e medidas administrativas estabelecidas no art. 165 deste Código ao condutor que se recusar a se submeter a qualquer dos procedimentos previstos no caput deste artigo.
O art. 165, caput, estabelece ser infração de trânsito dirigir sob a influência de álcool, porém não estabelece qual o nível de alcoolemia necessário para a caracterização do estado de influência.

Já, o art. 276 estabelece que qualquer nível de concentração de álcool por litro de sangue sujeita o condutor às penalidades previstas no art. 165, caput. Assim, aparentemente, inaugurou-se no Brasil o nível de tolerância zero para a alcoolemia. Entretanto, tal constatação é apenas aparente, pois o parágrafo único do art. 276 determina que o Poder Executivo Federal discipline as margens de tolerância para casos específicos.

Regulamentando os artigos 276 e 306 do Código de Trânsito Brasileiro, foi publicado o Decreto nº 6.488, de 19 de junho de 2008, que estabeleceu que as margens de tolerância de álcool no sangue para casos específicos serão definidas em resolução do Conselho Nacional de Trânsito - CONTRAN, nos termos de proposta formulada pelo Ministro de Estado da Saúde.

Esse mesmo decreto determinou que enquanto não editado essa resolução do CONTRAN, a margem de tolerância será de dois decigramas por litro de sangue para todos os casos e que, quando a aferição da quantidade de álcool no sangue seja feito por meio de teste em aparelho de ar alveolar pulmonar (etilômetro), a margem de tolerância será equivalente a um décimo de miligrama por litro de ar expelido dos pulmões.

Até a presente data o CONTRAN não publicou a referida resolução, vigorando a tolerância prevista no Decreto nº 6.488/08, aplicável a todos os casos e não apenas aos casos específicos como determinado pelo parágrafo único do art. 276.

A caracterização do estado de influência de álcool não ocorre exclusivamente após a medição do nível de alcoolemia do condutor, pois nos termos do art. 165, parágrafo único, a embriaguez também poderá ser apurada na forma do art. 277.

O art. 277 elenca vários meios para a apuração da embriaguez: testes de alcoolemia, exames clínicos, perícia ou outro exame que, por meios técnicos ou científicos, em aparelhos homologados pelo CONTRAN, permitam certificar o estado do condutor.

Visando conferir ainda mais poder aos agentes de trânsito, o art. 277, § 2º, estabeleceu que a infração de dirigir embriagado também poderá ser comprovada pelo agente de trânsito mediante a obtenção de outras provas em direito admitidas, acerca dos notórios sinais de embriaguez, excitação ou torpor apresentados pelo condutor.

O art. 2º, § 1º da Resolução nº 206, de 20 de Outubro de 2006, do CONTRAN, estabelece que o os sinais de embriaguez que levaram o agente da Autoridade de Trânsito à constatação do estado do condutor e à caracterização da infração prevista no artigo 165 da Lei nº 9.503/97, deverão ser por ele descritos na ocorrência ou em termo específico que contenham as informações mínimas indicadas no Anexo dessa Resolução

Dessa forma, o condutor pode ser punido administrativamente por dirigir embriagado, mesmo quando não houver a quantificação de sua alcoolemia, bastando a certificação de seu estado pelos meios de prova previstos no art. 277 e seus parágrafos.

Segundo Damásio de Jesus, há na tipificação da infração de trânsito o elemento subjetivo "sob a influência" e por esse motivo a figura não se perfaz com a simples direção de veículo após o consumo de álcool ou substância similar, devendo haver a verificação de que o condutor esteja sob a influência da substância, ou seja, esteja sofrendo os seus efeitos, conduzindo de forma anormal, fazendo ziguezagues ou outros atos que revelem perigo ao trânsito seguro. [13]

O art. 277, § 3º, estabelece que "serão aplicadas as penalidades e medidas administrativas estabelecidas no art. 165 deste Código ao condutor que se recusar a se submeter a qualquer dos procedimentos previstos no caput deste artigo". A inaplicabilidade desse dispositivo é analisada no Capítulo 3.2.

2.3 O crime de dirigir embriagado
A antiga redação do art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro definia o crime de embriaguez ao volante nos seguintes termos:

Art. 306. Conduzir veículo automotor, na via pública, sob a influência de álcool ou substância de efeitos análogos, expondo a dano potencial a incolumidade de outrem:

Penas - detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.
Damásio de Jesus analisando o presente artigo classificava o delito como sendo de perigo concreto, exigindo-se a prova do perigo a pessoa determinada. [14]

Essa definição típica exigia que o condutor estivesse conduzindo veículo automotor, na via pública, sob a influência de álcool ou substância de efeitos análogos, expondo a dano potencial a incolumidade de outrem. Devendo todos esses elementos serem claramente demonstrados na peça acusatória.

Não se exigia a quantificação do nível de alcoolemia do condutor, porém deveria ser demonstrado a condução anormal do veículo de forma a expor a perigo de dano alguém. Como exemplos de condução anormal citam-se a direção em zig-zag, pela contramão ou em alta velocidade.

Assim, a configuração do delito poderia se dar por prova testemunhal, exame clínico ou outros meios de prova.

A Lei nº 11.705/2008, visando ampliar o rigor da lei frente ao condutor embriagado e a facilitar a prova do crime, estabeleceu uma quantidade mínima exigível de álcool no sangue do condutor e dispensou a prova do perigo de dano a terceiros.

Então, o delito passou a ser considerado como de perigo abstrato, visto este ser presumido pela lei, sob a razão de que a periculosidade típica da conduta já é suficiente para a imposição de sanção penal, mesmo sem a ocorrência efetiva de dano. Nesse sentido:

EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL - CRIME PREVISTO NO ART. 306 DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO - CASSAÇÃO DA SENTENÇA QUE DECLAROU A INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 306 DA LEI Nº 9.503/97 - POSSIBILIDADE – RECURSO PROVIDO.
Para a caracterização do tipo penal previsto no art. 306 da Lei nº 9.503/97, basta a comprovação da concentração de teor alcoólico no sangue, vez que o perigo, ou seja, a probabilidade jurídica de dano, é presumida (presunção juris et de jure).

Não se trata de violação aos princípios da adequação, proporcionalidade e ofensividade. Na verdade, essa foi a solução encontrada pelo legislador para proteger a coletividade. Privilegiou-se, no caso, o princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado, não havendo falar, portanto, em inconstitucionalidade do art. 306 do CTB. [15]

A nova redação do art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro, alterada pela Lei nº 11.705/2008, estabelece:

Art. 306. Conduzir veículo automotor, na via pública, estando com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas, ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência: (Redação dada pela Lei nº 11.705, de 2008)

Penas - detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor. Parágrafo único. O Poder Executivo federal estipulará a equivalência entre distintos testes de alcoolemia, para efeito de caracterização do crime tipificado neste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.705, de 2008)
O nível de alcoolemia (concentração de álcool por litro de sangue) igual ou superior a 6 (seis) decigramas foi inserido como elementar do tipo incriminador, devendo claramente ser comprovado pela acusação sob pena de atipicidade da conduta.

Essa medição, por se tratar de medida técnica, necessita de demonstração pericial ou, como previsto no parágrafo único do art. 306, também pode ser demonstrada através de outros testes homologados pelo Poder Executivo Federal. Nos termos do Decreto 6.488/2008, a alcoolemia também poderá ser provada por teste em aparelho de ar alveolar pulmonar (etilômetro).

Dessa forma, não se consegue aferir a concentração de álcool por litro de sangue através de prova testemunhal, exame clínico, confissão ou outro meio de prova, tendo o legislador limitado o meio de prova admissível. Nesse sentido já decidiu o Egrégio Superior Tribunal de Justiça:

RECURSO ESPECIAL. EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. AUSÊNCIA DE EXAME DE ALCOOLEMIA. AFERIÇÃO DA DOSAGEM QUE DEVE SER SUPERIOR A SEIS DECIGRAMAS. NECESSIDADE. ELEMENTAR DO TIPO.

1. Antes da edição da Lei nº 11.705/08 bastava, para a configuração do delito de embriaguez ao volante, que o agente, sob a influência de álcool, expusesse a dano potencial a incolumidade de outrem.

2. Entretanto, com o advento da referida Lei, inseriu-se a quantidade mínima exigível e excluiu-se a necessidade de exposição de dano potencial, delimitando-se o meio de prova admissível, ou seja, a figura típica só se perfaz com a quantificação objetiva da concentração de álcool no sangue o que não se pode presumir. A dosagem etílica, portanto, passou a integrar o tipo penal que exige seja comprovadamente superior a 6 (seis) decigramas.

3. Essa comprovação, conforme o Decreto nº 6.488 de 19.6.08 pode ser feita por duas maneiras: exame de sangue ou teste em aparelho de ar alveolar pulmonar (etilômetro), este último também conhecido como bafômetro.

4. Isso não pode, por certo, ensejar do magistrado a correção das falhas estruturais com o objetivo de conferir-lhe efetividade. O Direito Penal rege-se, antes de tudo, pela estrita legalidade e tipicidade.

5. Assim, para comprovar a embriaguez, objetivamente delimitada pelo art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro, é indispensável a prova técnica consubstanciada no teste do bafômetro ou no exame de sangue.

6. Recurso a que se nega provimento. [16]
A comprovação de exposição a dano potencial a incolumidade de outrem deixou de ser elemento do tipo penal, ocorrendo a adequação típica mesmo que o condutor estivesse dirigindo de forma normal, devendo a acusação simplesmente demonstrar que a concentração de álcool por litro de sangue era igual ou superior a 6 (seis) seis decigramas.

Entretanto, Damásio de Jesus sustenta posição contrária:

Não é suficiente prova de que o sujeito, embriagado, dirigiu veículo com determinada taxa de álcool no sangue ou que bebeu antes de dirigir. É imprescindível a demonstração da influência etílica na condução: que se tenha manifestado na forma de afetação efetiva da capacidade de dirigir veículo automotor, reduzindo ou alterando a capacidade sensorial, de atenção, de reflexos, de reação a uma situação de perigo (time-lag), com propensão ao sono etc. (modificação significativa das faculdades psíquicas ou sua diminuição no momento da direção), manifestando-se, como ficou consignado, numa condução imprudente, descuidada, temerária ou perigosa, de acordo com as regras da circulação viária.

CAPÍTULO III – A OBRIGATORIEDADE DOS EXAMES DE ALCOOLEMIA E O PRINCÍPIO nemo tenetur se detegere

3.1 As provas no processo penal e a colaboração do acusado

Prova é o conjunto de atos praticados pelas partes, pelo juiz ou por terceiros destinados a levar ao magistrado a convicção sobre a existência ou não de um fato concreto, possibilitando o conhecimento da causa e uma decisão justa de acordo com a lei.

Assim, a prova judiciária apresenta-se como um instrumento para a reconstrução dos fatos investigados no processo, devendo ser fiel a realidade efetivamente ocorrida.

Para a realização dessa tarefa são disponibilizados vários meios ou métodos de provas. Entretanto, tais meios não são ilimitados, devendo se adequar ao disposto na Constituição Federal e na legislação ordinária, principalmente em relação aos direitos e garantias individuais do acusado e de terceiros.

O princípio nemo tenetur se detegere apresenta-se como um limite às práticas do Estado com relação a produção de provas, resguardando além do direito ao silêncio, outros direitos do acusado, tais como a dignidade, a intimidade e a integridade corporal.

Algumas provas para serem produzidas necessitam de colaboração do acusado. Essas provas podem ser invasivas como o exame de sangue e a perícia ginecológica, necessitando de intervenção corporal no acusado, ou não invasivas como o exame grafotécnico e o etilômetro.

A prova do crime tipificado no art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro exige a constatação do nível de alcoolemia igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue, equivalente a 0,30 miligramas por litro de ar expelido dos pulmões, quando o exame for realizado em aparelho de ar alveolar pulmonar (etilômetro), segundo o Decreto nº 6.488/2008.

Para a medição da alcoolemia do acusado há dois principais métodos e ambos necessitam de sua colaboração ativa: a utilização do etilômetro, que requer um sopro no aparelho, e o exame de sangue, que necessita do consentimento do agente em dispor de seu sangue.

Em grande parte da legislação européia, anglo-americana e também argentina há previsão de situações nas quais o réu deve se submeter a determinadas ingerências corporais com finalidades probatórias. Nesses casos há previsão expressa de lei, rígido controle judicial e tratam de infrações penais para cuja comprovação o exame pericial mostra-se efetivamente necessário, quer pela complexidade do crime, quer pela impossibilidade de obtenção de outras provas. [18]

Entretanto, segundo Pacelli, apesar de haver algumas disposições expressas em lei determinando o acusado a participar da instrução penal, elas são reconhecidas como inconstitucionais por ferirem o princípio nemo tenetur se detegere. [19]

Nesse sentido já se manifestou o Supremo Tribunal Federal:

Aquele que sofre persecução penal instaurada pelo Estado tem, dentre outras prerrogativas básicas, o direito (a) de permanecer em silêncio, (b) de não ser compelido a produzir elementos de incriminação contra si próprio nem constrangido a apresentar provas que lhe comprometam a defesa e (c) de se recusar a participar, ativa ou passivamente, de procedimentos probatórios que lhe possam afetar a esfera jurídica, tais como a reprodução simulada do evento delituoso e o fornecimento de padrões gráficos ou de padrões vocais, para efeito de perícia criminal. [20]
Assim, a acusação não pode utilizar-se do acusado para produzir provas contrárias aos seus direitos, devendo buscar alternativas probatórias que não necessitem da colaboração do acusado.

É evidente o erro do legislador ordinário que, ao editar a Lei nº 11.705/2008, visando punir com maior rigor e facilitar a produção de provas da embriaguez ao volante, deixou a prova da infração totalmente dependente da colaboração do acusado, que não é obrigado a colaborar ativa ou passivamente com a formação de sua culpa, devido ao princípio nemo tenetur se detegere.

3.2 Da inaplicabilidade do art. 277, § 3º do Código de Trânsito Brasileiro
A Lei nº 11.705/2008 incluiu o §3º ao art. 277 do Código de Trânsito Brasileiro impondo a aplicação das penalidades e medidas administrativas estabelecidas no art. 165 deste Código ao condutor que se recusar a se submeter aos testes de alcoolemia, exames clínicos, perícias ou outros exames que permitam demonstrar o consumo de bebidas alcoólicas.

Segundo a Lei Complementar nº 95/1998, que dispõe sobre a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das leis, os parágrafos devem estabelecer aspectos complementares à norma enunciada no caput do artigo e as exceções à regra por este estabelecida.

Dessa forma, interpretando o real alcance do art. 277, §3º, verifica-se a imposição das penalidades e medidas administrativas estabelecidas no art. 165 deste Código ao condutor de veículo automotor, envolvido em acidente de trânsito ou que for alvo de fiscalização de trânsito, sob suspeita de dirigir sob a influência de álcool e que se recuse a ser submetido aos testes que permitam verificar o consumo de álcool.

Nos termos da inovação legal, presume-se a embriaguez desses condutores pelo simples fato de se negarem a colaborar na verificação do consumo de álcool.

Essa presunção mostra-se totalmente contrária ao princípio nemo tenetur se detegere, pois impõe uma sanção ao acusado que exerce o seu direito de não produzir provas contra si mesmo.

No mesmo sentido, Vicente Greco Filho ensina que na atual ordem constitucional, em razão da tutela do direito ao silêncio e presunção de inocência, a simples recusa do suspeito em realizar exames para constatação de embriaguez não pode lhe trazer conseqüências danosas, nem penalidades. [21]

A disposição do art. 277, §3º mostra-se logicamente inconciliável com o estabelecido no §2º do mesmo artigo, pois, se o agente de trânsito pode comprovar a embriaguez do condutor através de testes de alcoolemia, exames ou mesmo por outras provas admitidas em direito que demonstrem os notórios sinais de embriaguez, por que presumir a embriaguez pela simples recusa em realizar os testes de alcoolemia?

Caso o agente de trânsito ao fiscalizar o condutor verifique que ele está sob efeito de álcool devido aos claros sinais: odor etílico, fala desconexa e dificuldade de equilíbrio, basta aplicar o disposto no art. 277, § 2º e autuar o condutor pela infração do art. 165, observando os sinais que permitiram a constatação da embriaguez, mesmo que ele tenha se recusado a realizar os testes de alcoolemia.

Entretanto, caso o condutor fiscalizado se recuse a realizar os testes de alcoolemia e o agente de trânsito, ao analisar os sinais do condutor, não se convença da situação de embriaguez, não deve ser aplicada nenhuma penalidade, visto implicar em séria ofensa aos direitos assegurados no texto constitucional.

3.3 Da impossibilidade da prisão pelo crime de desobediência
A Advocacia Geral da União, por meio do Parecer nº 121/2009/AGU/CONJUR/DPRF/MJ, que visava orientar o Departamento de Polícia Rodoviária Federal na aplicação da Lei nº 11.705/08, manifestou-se pela obrigatoriedade do condutor fiscalizado em se submeter aos testes de alcoolemia, determinando a prisão por crime de desobediência (art. 330, Código Penal) daqueles que se negarem.

O crime de desobediência está previsto no art. 330 do Código Penal Brasileiro e dispõe in verbis:

Art. 330 - Desobedecer a ordem legal de funcionário público:

Pena - detenção, de quinze dias a seis meses, e multa.
O núcleo do tipo é o verbo desobedecer que significa deixar de atender, não cumprir a ordem legal de funcionário público, fazendo ou deixando de fazer algo imposto legalmente.

A ordem emanada do funcionário público deve ser formal e materialmente legal, bem como ele deve possuir atribuições para a prática do ato.

Segundo Rogério Greco, não se poderá tipificar o crime se a pessoa receptora da ordem não tinha o dever legal de cumpri-la. [22]

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal manifesta-se no sentido que o sujeito a quem a ordem é dirigida poderá deixar de cumpri-la quando essa implicar em possibilidade de auto-incriminação, em razão do princípio da não obrigatoriedade de produzir provas contra si mesmo:

EMENTA: HABEAS CORPUS. CRIME DE DESOBEDIÊNCIA. RECUSA A FORNECER PADRÕES GRÁFICOS DO PRÓPRIO PUNHO, PARA EXAMES PERICIAIS, VISANDO A INSTRUIR PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO DO CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO. NEMO TENETUR SE DETEGERE. Diante do princípio nemo tenetur se detegere, que informa o nosso direito de punir, é fora de dúvida que o dispositivo do inciso IV do art. 174 do Código de Processo Penal há de ser interpretado no sentido de não poder ser o indiciado compelido a fornecer padrões gráficos do próprio punho, para os exames periciais, cabendo apenas ser intimado para fazê-lo a seu alvedrio. É que a comparação gráfica configura ato de caráter essencialmente probatório, não se podendo, em face do privilégio de que desfruta o indiciado contra a auto-incriminação, obrigar o suposto autor do delito a fornecer prova capaz de levar à caracterização de sua culpa. Assim, pode a autoridade não só fazer requisição a arquivos ou estabelecimentos públicos, onde se encontrem documentos da pessoa a qual é atribuída a letra, ou proceder a exame no próprio lugar onde se encontrar o documento em questão, ou ainda, é certo, proceder à colheita de material, para o que intimará a pessoa, a quem se atribui ou pode ser atribuído o escrito, a escrever o que lhe for ditado, não lhe cabendo, entretanto, ordenar que o faça, sob pena de desobediência, como deixa transparecer, a um apressado exame, o CPP, no inciso IV do art. 174. Habeas corpus concedido. [23]
No mesmo sentido manifestou-se o Tribunal Regional Federal da 4ª Região:

HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. PENAL. DETERMINAÇÃO JUDICIAL DE APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTOS POR PARTE DO RÉU. CRIME DE DESOBEDIÊNCIA E CONSEQÜÊNCIAS PROCESSUAIS. PRINCÍPIO DA NÃO AUTO-INCRIMINAÇÃO. ABRANGÊNCIA. DIREITO AO SILÊNCIO E NÃO-COLABORAÇÃO NA INSTRUÇÃO PROCESSUAL. ÔNUS PROBATÓRIO. INVERSÃO INDEVIDA. EXERCÍCIO DE DIREITO FUNDAMENTAL. PREJUÍZOS AO TITULAR. IMPOSSIBILIDADE.

1. Ameaçada a configuração de crime de desobediência e estando implícito o risco de prisão em flagrante, é cabível a impetração da ação constitucional de habeas corpus.

2. O princípio da não auto-incriminação, consagrado pela evolução histórica e combativa dos direitos individuais, força o Estado-acusador a desincumbir-se de seu ônus probatório, jamais se podendo exigir justamente do cidadão-acusado colaboração em sua própria condenação.

3. A não auto-incriminação garante não somente o silêncio, mas impede o exercício forçado de qualquer ato de colaboração na formação da culpa.

4. Requisitando a decisão atacada a apresentação por parte do paciente de documentos comprovantes de contas bancárias que este sequer reconhece a existência e ameaçando com as conseqüências processuais e legais da desobediência, há ofensa ao direito de autodefesa do réu e ao princípio da não auto-incriminação.

5. Determinação de tal índole ocasiona deslocamento do ônus probatório da culpa do réu em processo penal para a defesa, o que é inadmissível frente aos princípio regentes do processo penal.

6. Do exercício de direito fundamental (não auto-incriminação) não pode decorrer prejuízo ao seu titular, tal como presunção de culpa, e muito menos sanções processuais ou de repressão criminosa.

7. Ordem concedida para afastar a exigência de apresentação pelo réu dos documentos de conta bancária, sem que sejam cabíveis quaisquer represálias - processuais ou criminais - pelo exercício do fundamental direito de não auto-incriminação. [24]
Assim, no caso em tela, o condutor que se recusar a se submeter aos testes de alcoolemia não poderá ser preso pelo crime de desobediência, pois estará a exercer um direito constitucionalmente assegurado e não simplesmente recusando-se a cumprir uma ordem legal.

Reforçando o entendimento que veda a prisão pelo crime do art. 330 do Código Penal está o ensinando de Nelson Hungria:

Se, pela desobediência de tal ou qual ordem oficial, alguma lei comina determinada penalidade administrativa ou civil, não deverá reconhecer o crime em exame, salvo se a dita lei ressalva expressamente a cumulativa aplicação do art. 330. [25]

Esse é também o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

HABEAS CORPUS. PREFEITO MUNICIPAL. CRIME DE DESOBEDIÊNCIA DE ORDEM JUDICIAL PROFERIDA EM MANDADO DE SEGURANÇA COM PREVISÃO DE MULTA DIÁRIA PELO SEU EVENTUAL DESCUMPRIMENTO. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. ATIPICIDADE DA CONDUTA. PRECEDENTES DO STJ. ORDEM CONCEDIDA.

1. Consoante firme jurisprudência desta Corte, para a configuração do delito de desobediência de ordem judicial é indispensável que inexista a previsão de sanção de natureza civil, processual civil ou administrativa, salvo quando a norma admitir expressamente a referida cumulação.

2. Se a decisão proferida nos autos do Mandado de Segurança, cujo descumprimento justificou o oferecimento da denúncia, previu multa diária pelo seu descumprimento, não há que se falar em crime, merecendo ser trancada a Ação Penal, por atipicidade da conduta. Precedentes do STJ.

3. Parecer do MPF pela denegação da ordem.

4. Ordem concedida, para determinar o trancamento da Ação Penal 1000.6004. 2056, ajuizada contra o paciente. [26]
O art. 277, § 3º do Código de Trânsito Brasileiro estabelece que ao condutor que se recusar aos testes de alcoolemia serão aplicadas as penalidades e medidas administrativas contidas no art. 165.

Assim, inviável torna-se a tipificação do crime de desobediência a essa conduta do condutor de veículo automotor, em razão da ausência de norma expressa autorizando a cumulação de sanções e da violação ao princípio nemo tenetur se detegere, não devendo o parecer da Advocacia Geral da União ser acolhido pelo Departamento de Polícia Rodoviária Federal.

CONCLUSÃO
O princípio nemo tenetur se detegere é um direito fundamental de 1ª geração e visa proteger o indivíduo do Estado, limitando o poder estatal durante a investigação e instrução penal, que não poderá obrigar o acusado a colaborar na produção probatória, protegendo a sua intimidade, dignidade e integridade moral e corporal.

Esse princípio harmoniza-se com os princípios do devido processo legal, ampla defesa, contraditório e presunção de inocência, tornando-se parte do atual processo penal vigente após a Constituição Federal de 1988.

O princípio possui diversas dimensões, garantindo ao acusado o direito ao silêncio e de não colaborar com a investigação ou a instrução criminal; direito de não declarar contra si mesmo; direito de não apresentar provas que prejudique sua situação jurídica e de não praticar nenhum comportamento ativo que lhe comprometa; direito de não ceder seu corpo (total ou parcialmente) para a produção de prova incriminatória.

Há entendimentos restritivos que sustentam que o princípio nemo tenetur se detegere não está expressamente previsto no texto constitucional, mas apenas no Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e na Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), ambos acordos internacionais internalizados no ordenamento jurídico brasileiro.

Entretanto, segundo o atual entendimento do Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário nº 466343 em 03 de dezembro de 2008, os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos gozam de status supralegal, tornando inaplicável toda a legislação ordinária com eles incompatíveis, mesmo quando não submetidos ao procedimento previsto no art. 5º, § 3º da Constituição Federal.

Assim, o princípio é aplicável no ordenamento jurídico brasileiro, não podendo a legislação ordinária contrariá-lo, impondo ao acusado o dever de colaborar com a investigação ou instrução criminal, produzindo provas em seu desfavor.

Analisaram-se os efeitos provocados pelo álcool no organismo humano e conclui-se que ele é um fator causador e agravador de acidentes de trânsito por limitar várias funções e sentidos necessários aos condutores de veículos automotores. Desse modo, a conduta daquele que dirige estando alcoolizado deve ser reprimida severamente.

A Lei nº 11.705/2008, conhecida como Lei Seca, alterou diversos dispositivos do Código de Trânsito Brasileiro - CTB visando punir mais rigorosamente os condutores que dirigem sob efeito de álcool e coibir esse comportamento.

O art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro, que tipifica o crime de dirigir embriagado, teve a sua redação alterada, passando a constar como elementar do tipo incriminador o nível de alcoolemia (concentração de álcool por litro de sangue) igual ou superior a 6 (seis) decigramas.

Tratando-se de medida técnica, é necessário demonstração pericial nos termos do art. 158 do Código de Processo Penal ou, como previsto no parágrafo único do art. 306, também poderá ser demonstrado pelo teste em aparelho de ar alveolar pulmonar (etilômetro).

Assim, em ambos os casos, é necessária a colaboração do acusado que precisará assoprar o etilômetro ou permitir a coleta de sangue para exame pericial.

O princípio nemo tenetur se detegere garante ao acusado o direito de se negar a colaborar na produção probatória em seu desfavor, ficando a tipificação do crime de embriaguez ao volante condicionada à vontade do acusado em colaborar assoprando o etilômetro ou cedendo sangue para exame.

Trata-se de erro do legislador ordinário que, ao invés de aumentar o rigor no combate a essa conduta, acabou dificultando a punição do condutor infrator.

O art. 165 do Código de Trânsito Brasileiro pune administrativamente o condutor de veículo automotor que dirige sob influência de álcool e, ao contrário do art. 306, não determina nível mínimo de alcoolemia, nem limita a produção probatória, permitindo a constatação do consumo de álcool por exames, testes ou até mesmo pelos sinais característicos apresentados pelo condutor durante a fiscalização de trânsito.

O § 3º do art. 277, determina a aplicação das penalidades e medidas administrativas previstas no art. 165 aos condutores de veículo automotores que se recusarem a submissão aos exames e testes de alcoolemia.

Dessa forma, criou-se verdadeira presunção legal de embriaguez, punindo administrativamente o acusado que se recusa a produzir provas em seu desfavor. Devido à incompatibilidade entre essa disposição e o princípio nemo tenetur se detegere, o disposto no art. 277, § 3º mostra-se inaplicável.

Não obstante o parecer elaborado pela Advocacia Geral da União para subsidiar o Departamento de Polícia Rodoviária Federal na aplicação da Lei º 11.705/08 tenha indicado a possibilidade de prisão pelo crime de desobediência (art. 330, Código Penal) ao condutor que se recusar a realizar os exames e testes de alcoolemia, o princípio objeto desse estudo impede a imposição de sanções penais aos condutores que se recusarem a colaborar na produção da prova da alcoolemia.

Durante o estudo analisou-se a interpretação conferida pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Superior Tribunal de Justiça ao princípio nemo tenetur se detegere e as disposições da Lei nº 11.705/08, verificando-se que ambos os tribunais adotam a posição defendida no trabalho, negando a obrigatoriedade do condutor em colaborar na produção da prova de sua alcoolemia e impedindo que isso lhe traga qualquer sanção penal ou administrativa.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Departamento de Adolescência da Sociedade Brasileira de Pediatria. Uso e abuso de álcool na adolescência. Revista Oficial do Núcleo de estudos da Saúde do Adolescente. Agosto de 2007. v. 4. n. 3. p. 6-17.

FRANÇA, Genival Veloso de. Medicina legal – 6ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Coogan, 2001.

GOMES, Luiz Flávio. Princípio da não auto-incriminação: significado, conteúdo, base jurídica e âmbito de incidência. Disponível em . Acesso em: 04-02-2011.

GRECO FILHO, Vicente. A culpa e sua prova nos delitos de trânsito. São Paulo: Saraiva, 1993.

HUNGRIA, Nelson. Comentários ao código penal. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1959. v. IX.

JESUS, Damásio E. de. Crimes de trânsito. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.

OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de processo penal. 7. ed. ver. Atual. e ampl. Belo Horizonte: Del Rey, 2007.

QUEIJO, Maria Elizabeth. O direito de não produzir provas contra si mesmo: o princípio nemo tenetur se detegere e suas conseqüências no processo penal. São Paulo: Saraiva, 2003.

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009.

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Notas
1.QUEIJO, Maria Elizabeth. O direito de não produzir provas contra si mesmo: o princípio nemo tenetur se detegere e suas conseqüências no processo penal. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 54-55.2.GOMES, Luiz Flávio. Princípio da não auto-incriminação: significado, conteúdo, base jurídica e âmbito de incidência. Disponível em . Acesso em: 04-02-2011.
3.BRASIL. Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Apelação Criminal nº 1.0231.04.027123-2/001. Relator: Desembargador Antônio Armando dos Anjos. Publicado no DOMG de 29-11-2007.
4.LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 440-444.
5.BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 466.343. Relator: Ministro César Peluso. Publicado no DJe de 05-06-2009.
6.TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 27.
7.QUEIJO, Maria Elizabeth. O direito de não produzir provas contra si mesmo: o princípio nemo tenetur se detegere e suas conseqüências no processo penal. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 72-73.
8.Ibidem, p. 75.
9.NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 1083.
10.ANDRADE, Arthur Guerra de. Álcool e suas conseqüências: uma abordagem multiconceitual. Barueri: Minha Editora, 2009. p. 163.
11.FRANÇA, Genival Veloso de. Medicina Legal – 6ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Coogan, 2001. p. 299.
12.ANDRADE, Arthur Guerra de. Álcool e suas conseqüências: uma abordagem multiconceitual. Barueri: Minha Editora, 2009. p. 150.
13.JESUS, Damásio E. de. Crimes de Trânsito. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 152.
14.Ibidem. p. 6.
15.BRASIL. Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Apelação Criminal nº 1.0040.09.094612-6/001. Relator: Desembargador Herbert Carneiro. Publicado no DOMG de 01-09-2010.
16.BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n 1113360/DF. Relator: Ministro Og Fernandes. Publicado no DJe de 18-10-2010.
17.JESUS, Damásio E. de. Crimes de Trânsito. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 155.
18.OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de processo penal. 7. ed. ver. atual. e ampl. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. p. 340-341.
19.Ibidem. p. 341.
20.BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 96219 MC/SP. Relator: Ministro Celso de Mello. Publicado no DJe de 15-10-2008.
21.GRECO FILHO, Vicente. A culpa e sua prova nos delitos de trânsito. São Paulo: Saraiva, 1993. p.146.
22.GRECO, Rogério. Código penal comentado. 5. ed. Niterói, RJ: Impetus, 2011. p. 933.
23.BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 77135/SP. Relator: Ministro Ilmar Galvão. Publicado no DJe de 06-11-1998.
24.BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Habeas Corpus nº 2005.04.01.019437-8/PR. Relator: Desembargador Federal Néfi Cordeiro. Publicado no DJU de 29-06-2005.
25.HUNGRIA, Nelson. Comentários ao código penal. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1959. v. IX. p. 420.
26.BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus nº 2655/ES. Relator: Ministro Napoleão Nunes Maia Filho. Publicado no DJ de 25-11-2008.


AUTOR: Gabriel Costa de Jesus, Policial Rodoviário Federal. Bacharel em Direito pela UNIMONTES. Pós-graduado em Ciências Criminais pela UNAR. Presidente de JARI e secretário de Comissão de Defesa de Autuação.


Fonte : Jus Navigandi

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MANDADO DE INJUNÇÃO


MANDADO DE INJUNÇÃO art. 5º, LXXI – conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania; O Mandado de Injunção surgiu para impedir que a falta de norma regulamentadora tornasse inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. Slaibi Filho ensina que, em termos jurídicos, “a injunção pode ser definida como ordem com a qual o juiz impõe uma obrigação de fazer ou de não cumprir um ato determinado, cuja violação constitui um atentado ao direito”. O STF já fixou entendimento de que tal ação é de aplicabilidade imediata, posto que é norma de eficácia plena, e independe de regulamentação, devendo seguir o rito do mandado de segurança, no que couber (RTJ 133/11). Os sujeitos ativos (impetrantes)são: a pessoa individualmente situada, o grupo, a associação, o sindicato , etc., enfim, todas as pessoas referidas no Capítulo I, pois o conjunto, é certo, deve prevalecer sobre o individual (v.g. inciso XXI, da CRFB/88), a impetração do MI se dará contra quem tenha o dever de regulamentar a norma constitucional, como o Congresso Nacional, Presidente da República, Poder, órgão etc. Admite-se o MI coletivo, por analogia ao inciso LXX, que trata do MS coletivo (STF, MI 102/PE ). Os requisitos para interposição do MI, sâo: I – falta de norma regulamentadora; II – inviabilização do exercício de direitos e liberdades constitucionais e de prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. A mora do legislador estará caracterizada somente após o decurso de certo prazo para a confecção da norma reclamada, seguindo o princípio da razoabilidade. Jurisprudência – Supremo Tribunal Federal “MANDADO DE INJUNÇÃO COLETIVO: admissibilidade, por aplicação analógica do art. 5., LXX, da Constituição; legitimidade, no caso, entidade sindical de pequenas e médias empresas, as quais, notoriamente dependentes do crédito bancário, têm interesse comum na eficácia do art. 192, par. 3., da Constituição, que fixou limites aos juros reais. MORA LEGISLATIVA: exigência e caracterização: critério de razoabilidade. A mora - que é pressuposto da declaração de inconstitucionalidade da omissão legislativa -, é de ser reconhecida, em cada caso, quando, dado o tempo corrido da promulgação da norma constitucional invocada e o relevo da matéria, se deva considerar superado o prazo razoável para a edição do ato legislativo necessário à efetividade da lei fundamental; vencido o tempo razoável, nem a inexistência de prazo constitucional para o adimplemento do dever de legislar, nem a pendência de projetos de lei tendentes a cumpri-lo podem descaracterizar a evidencia da inconstitucionalidade da persistente omissão de legislar.” (STF, MI 361/RJ, relator Ministro Néri da Silveira, publicação DJ 17/06/1994) se existe lei (MI 152/DF), ainda que incompleta, não há se falar em direito ao Mandado de Injunção. Também não cabe essa ação sem a presença do requisito fundamental de existência de direito concedido pela Constituição que estaria inviabilizado em razão da ausência de norma infraconstitucional regulamentadora: Jurisprudência – Supremo Tribunal Federal “MANDADO DE INJUNÇÃO: SEGUIMENTO NEGADO PELO RELATOR: LEGITIMIDADE. INEXISTÊNCIA DE DIREITO CONCEDIDO PELA CONSTITUIÇÃO QUE ESTARIA INVIABILIZADO EM RAZÃO DE INEXISTIR NORMA INFRACONSTITUCIONAL REGULAMENTADORA. C.F., art. 5º, LXXI. O preceito constitucional invocado pela impetrante, C.F., art. 156, § 3º, II, não menciona o serviço prestado pela impetrante. A impetrante não é titular, portanto, de direito concedido pela Constituição, cujo exercício estaria inviabilizado pela ausência de norma infraconstitucional.” (STF, MI 590 AgR/RJ, relator Ministro Carlos Velloso, publicação DJ 09/05/2003) Segundo a jurisprudência do STF, não é possível a concessão de liminar em Mandado de Injunção (STF, MI 535/SP). Analisando inúmeros julgados do S.T.F, se amalisa, que tal instrumento perdeu seu vigor por entender esse Tribunal que não deve o Judiciário regular o caso concreto levado a julgamento, mas apenas comunicar a questão ao órgão encarregado da norma elaboradora. Assim, a decisão limita-se a declarar a omissão e comunicar o Poder competente. Jurisprudência – Supremo Tribunal Federal “MANDADO DE INJUNÇÃO. NATUREZA. O mandado de injunção nem autoriza o judiciário a suprir a omissão legislativa ou regulamentar, editando o ato normativo omitido, nem, menos ainda, lhe permite ordenar, de imediato, ato concreto de satisfação do direito reclamado: mas, no pedido, posto que de atendimento impossível, para que o tribunal o faça, se contém o pedido de atendimento possível para a declaração de inconstitucionalidade da omissão normativa, com ciência ao órgão competente para que a supra.” (STF, MI 168/RS, relator Ministro Sepúlveda Pertence, publicação DJ 20/04/1990) “Esta Corte, recentemente, ao julgar o mandado de injunção 188, decidiu por unanimidade que só tem legitimatio ad causam, em se tratando de mandado de injunção, quem pertença a categoria a que a Constituição Federal haja outorgado abstratamente um direito, cujo exercício esteja obstado por omissão com mora na regulamentação daquele.” (STF, MI 107/DF, relator Ministro Moreira Alves, publicação DJ 02/08/1991) Note-se que há várias semelhanças entre essa ação e a Ação Declaratória de Inconstitucionalidade por Omissão, prevista no art. 103, § 2º, em razão de que ambas buscam suprir omissão legislativa. Porém, cabe destacar, que há diferenças marcantes, em especial no que tange à legitimação ativa (art. 103, I a IX), objeto (controle abstrato) e julgamento (art. 102, I, ‘a’).